Saiu na Carta Capital:
Tsunami de Liquidez
Defesa legítima
Não restou dúvida que Dilma
Rousseff soube aproveitar a oportunidade de sua visita à feira de
ciências em Hannover e as conversas com a chanceler alemã, Angela
Merkel, para sustentar com clareza que o Brasil não vai deixar de usar
todo o arsenal de medidas que julgar adequado para defender sua economia
dos danos colaterais causados pelo aumento de liquidez decidido pelos
países desenvolvidos para livrar do sufoco suas combalidas economias.
Em entrevista à mídia
internacional, a presidenta disse que manifestou diretamente a Merkel
sua preocupação com a expansão monetária (o tsunami de liquidez) que
ajuda a resolver problemas internos dos sistemas financeiros na Europa e
também nos Estados Unidos, mas que resulta na desvalorização das
moedas, com efeitos adversos para o comércio exterior brasileiro e de
muitos outros países emergentes. A chanceler alemã já fizera circular
que ia dizer a Dilma Rousseff que ela tem razão, explicando que as
megaoperações de liquidez são para dar tempo aos países do euro de
realizarem suas reformas. E que tais operações não mais se repetiriam.
O problema dramático é que a
perspectiva do tempo para as reformas é de três anos no mínimo e o
tsunami está aí e vai continuar produzindo destruição com o excesso de
entrada dos dólares nos emergentes, dentre os quais o Brasil. Estamos
recebendo muito mais capitais, a título de “investimento”, mas que na
realidade são empréstimos intercompanhias ou pura especulação em busca
de resultados pelo diferencial de juros. É certo que o processo de
redução da Selic ajuda (a taxa caiu 0,75 na reunião do Copom da
quarta-feira 7), mas ainda leva tempo para neutralizar a diferença.
Uma coisa é certa: o Brasil não
tem outra saída a não ser se defender desse capital, porque a
desvalorização do dólar tem um efeito prejudicial nas exportações de
nossa indústria e afeta o emprego em todo o sistema produtivo. O Brasil
precisa pensar em dar empregos de boa qualidade a 150 milhões de
brasileiros em 2030 e não vai poder fazer isso com o atual sistema de
exportação e sem expandir o setor de serviços. E não vai conseguir sem
proteger a sofisticação da estrutura industrial que estamos permitindo
ser destruída pela supervalorização cambial.
Um pouco disso é que eu penso
que a presidenta Dilma foi dizer para Merkel: compreendemos os problemas
europeus, o drama que vocês estão passando, mas os danos causados na
indústria brasileira não são suportáveis. Então, não venha a Europa com
essa história de que o Brasil toma medidas que violam as normas, as
leis, a teoria… Eu estou simplesmente me defendendo dos efeitos de
falsas teorias que vocês europeus desenvolvidos estão usando.
Aqui é preciso dizer sem receio
que esse é um jogo de enorme cinismo: tanto os Estados Unidos quanto a
Europa, esta com a cobertura do Banco Central Europeu, estão sim numa
competição feroz para melhorar suas exportações. Os americanos pelo
menos foram claros: o presidente Barack Obama, em campanha pela
reeleição, disse aos trabalhadores que “estamos apoiando o setor
exportador e pretendemos dobrar as exportações da indústria em cinco
anos”, enquanto a Europa simplesmente está escondendo esse fato. O
aumento das exportações da Grécia, da Itália, da Espanha e de Portugal é
uma das poucas posssibilidades de minorar o seu sofrimento dentro do
euro.
Agora, exportar para onde? Para
mercados de países emergentes, como o brasileiro. Não para a China, que
está surfando a taxa de câmbio que deseja, ligada a um “dollar
standard”, e não dá a menor atenção para reclamações, sem vergonha e sem
remorso. Nós só estamos tentando levar o real para um nível que permita
defender a indústria, que está sendo alvo de um processo de destruição
por conta da sobrevalorização cambial.
Não estamos fazendo nada errado, não estamos violando nenhuma regra do comércio internacional, estamos nos defendendo. Quero que alguém aponte alguma violação importante sob quaquer aspecto. Aliás, seis meses atrás, o FMI ainda insistia que não se devia fazer controle de capital. Hoje, o mesmo Fundo Monetário Internacional diz o seguinte: os países emergentes têm, sim, o direito de recorrer a medidas que limitem o ingresso de capitais que não estejam identificados com investimentos na produção, com a necessidade de crescimento…
O governo tenta separar aquilo
que é investimento que vai aumentar a produção daquilo que é pura
especulação. Não é uma coisa simples, mas ele está fazendo isso com
cuidado, usando medidas milimétricas.
Sintonia Fina
- Conversa Afiada
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