É comum se escutar nos Estados Unidos, por parte daqueles que defendem o conteúdo livre na internet, que os Estúdios Disney bancam um caríssimo lóbi para que ninguém faça com eles a mesma coisa que seu fundador Walt Disney fez com os irmãos Grimm. Pois é. O rei do cinema infantil teria roubado e adaptado várias histórias dos contos de fada populares. E sem pagar nada por isso.
Da mesma forma, a “Meca do Cinema” surgiu quando um grupo de judeus (Daryl Zanuck, Samuel Bronston, Samuel Goldwyn etc) fugiu de Nova Iorque para um pequeno povoado da Costa Oeste dos EUA chamado Hollywoodland, fundando os primeiros estúdios (Fox, Universal, Paramount, Metro Goldwyn Meyer). E sabem por quê? Para não pagarem royalties a Thomas Edison, inventor e detentor da patente do cinetoscópio (posteriormente melhorado e rebatizado de cinematógrafo pelos irmãos Lumière).
Esse preâmbulo é para mostrar que a indústria do cinema nasceu de uma imensa pirataria – industrial e intelectual.
Só que os estúdios estão provando do próprio veneno e passam hoje pela mesma crise por qual passou a indústria fonográfica há 10 anos: a crise do compartilhamento.
A música sofreu primeiro porque os arquivos digitais de áudio são muito mais “leves” que os arquivos de vídeo. Mesmo quando a banda de internet não era tão larga assim era fácil compartilhar os mp3 da vida – o saudoso Napster não me deixar mentir.
Daí nasceram os sites de upload, com terabytes à vontade para quem quisesse “subir” e “baixar” qualquer coisa. E os filmes se tornaram acessíveis a qualquer um por meio do compartilhamento.
Agora, é preciso definir o que é pirataria e o que não é.
Que jogue a primeira pedra aquele que nunca fez um download ou escutou de graça uma música no Youtube. Quem nunca tirou xerox de um livro na faculdade.
Há ainda o farisaísmo dos que condenam quem não pode pagar 30 reais num cd de música, mas manda destravar o PlayStation do filho porque, afinal de contas, a versão original mais nova do Fifa custa os olhos da cara…
Existe, contudo, uma grande diferença entre comprar um disco numa carrocinha e baixá-lo de um site qualquer. As carrocinhas alimentam uma grande rede internacional de pirataria. Um amigo que estuda o tema me chamou para ver uma cópia pirata do filme Wolverine em que nas cenas de ação apareciam claramente os cabos que suspendem os atores e os prédios eram maquetes. Ou seja, a cópia foi feita antes mesmo da finalização do filme – provavelmente, roubada de dentro do estúdio, coisa que só uma máfia poderia fazer.
Baixar um filme de um site é como o maconheiro que planta sua cannabis em casa para consumo próprio. Fica doidão do mesmo jeito e não financia o tráfico de drogas.
Mas já notaram que o esforço para se combater as carrocinhas e a máfia que está por trás delas é ínfimo? De vez em quando, uma apreensão aqui e acolá, levando para a cadeia apenas os peixes pequenos. E pronto.
Obviamente, os estúdios sabem que os consumidores dos filmes piratas de péssima qualidade não é seu público alvo. É um lascado que não vai gastar boa parte do seu suado salário mínimo para levar a mulher e os filhos a um cinema, que está saindo a quase 20 reais por cabeça. Comprando o filme a 3 contos, assiste todo mundo de casa e a vizinhança inteira.
O problema é a classe média. Essa está baixando os filmes no conforto do lar, com sua banda larguíssima. Mas também é essa de quem se espera as bilheterias astronômicas dos Titanics e similares, quem deve comprar os blue-rays e sustentar a vida nababesca de Hollywood.
É por isso que o alvo principal da indústria do cinema não são as carrocinhas e, sim, os sites de compartilhamento. Por isso que eles estão tentando aprovar no mundo todo leis antipirataria para criminalizar quem compartilha na internet – como a tal SOPA (Stop Online Piracy Act) nos EUA. No Brasil, a ministra Ana de Holanda (irmã de Chico Buarque) enviou proposta semelhante ao Congresso Nacional.
Japão, China e Korea afirmaram que, mesmo que as leis sejam aprovadas nos EUA, não terão valor algum dentro da soberania de seus países. Mas a Europa já entregou os hosters de toda zona do euro para o FBI.
O FBI fechou o site Megaupload e prendeu seus donos, numa operação internacional que deve ter deixado o narcotráfico com dor de cotovelo. O site tinha cópia de filmes arquivados por alguns usuários? Tinha, claro. Mas também tinha arquivos pessoais de centenas de milhares de outros usuários, que perderam tudo de uma hora para outra.
O Anonymous, famoso grupo internacional pela livre informação na internet, reagiu e derrubou o site do FBI, do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, da Universal Music, da Associação de Filmes dos EUA e da Associação da Indústria Fonográfica do país, dentre outros endereços. Artistas saíram em defesa do Megaupload. Dentre eles, Chris Brown, Snoop Dogg, Mary J Blige, P Diddy, Will.i.am, Alicia Keys e Kanye West. Vejam o vídeo:
Há uma guerra virtual em andamento e muita gente nem se toca.
Na minha opinião, a indústria do cinema está cometendo o mesmo erro que a da música cometeu no começo da era do compartilhamento. Tentar proibir é o mesmo que enxugar gelo. Para cada porta que se fecha, abre-se duas janelas. Não dá para se promover um estilo de vida e, paradoxalmente, negar-se o acesso a ele. Porque vai ter sempre um adolescente disposto a matar e morrer por um tênis da Nike.
É preciso mudar o modelo de negócios para incluir mais gente e baratear o produto. Também é possível cobrar dos sites de compartilhamento que estão ganhando dinheiro com isso.
A música fez concessões e hoje já existe um volume considerável de venda pela internet. Ao invés de comprar o cd inteiro, pode-se baixar faixas e pagar uns dólares por elas (o que é muito mais racional, diga-se).
As gravadoras perderam? Claro. A mídia igualmente, pois dos 30 reais cobrados num disco uma parte era para pagar o jabá das rádios e TVs da vida – que não deixou de existir, registre-se, mas diminuiu.
Talvez, também seja o caso de reduzir a quantidade de Ferraris e Maseratis circulando no antigo povoado de Hollywoodland.
Na minha opinião, a indústria do cinema está cometendo o mesmo erro que a da música cometeu no começo da era do compartilhamento. Tentar proibir é o mesmo que enxugar gelo. Para cada porta que se fecha, abre-se duas janelas. Não dá para se promover um estilo de vida e, paradoxalmente, negar-se o acesso a ele. Porque vai ter sempre um adolescente disposto a matar e morrer por um tênis da Nike.
É preciso mudar o modelo de negócios para incluir mais gente e baratear o produto. Também é possível cobrar dos sites de compartilhamento que estão ganhando dinheiro com isso.
A música fez concessões e hoje já existe um volume considerável de venda pela internet. Ao invés de comprar o cd inteiro, pode-se baixar faixas e pagar uns dólares por elas (o que é muito mais racional, diga-se).
As gravadoras perderam? Claro. A mídia igualmente, pois dos 30 reais cobrados num disco uma parte era para pagar o jabá das rádios e TVs da vida – que não deixou de existir, registre-se, mas diminuiu.
Talvez, também seja o caso de reduzir a quantidade de Ferraris e Maseratis circulando no antigo povoado de Hollywoodland.
Sintonia Fina
-Acerto de Contas
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