Sérgio Amadeu |
O Senado dos Estados
Unidos programa votar a Lei de Paralisação da Pirataria Online (SOPA -
Stop Online Piracy Act) no próximo dia 24. Caso aprovada, ela permitirá a
criminalização de conteúdos da web. Para isso, basta que sejam
considerados ilegais ou perigosos pelo governo norte-americano. As
implicações do novo marco legal norte-americano têm o poder de afetar o
ciberespaço como um todo. Segundo o especialista na área, Sérgio Amadeu,
se a lei for aprovada, o mundo verá a primeira grande derrota da
cultura da liberdade na web.
Qual é o conteúdo desse projeto de lei? Por que é tão polêmico?
[
Sérgio Amadeu ] O SOPA, apresentado em outubro de 2011 na Câmara dos
Deputados dos EUA, é praticamente um complemento do Protect IP Act
(PIPA), apresentado quatro meses antes no Senado norte-americano. As
duas propostas legislativas visam bloquear o acesso a sites e aplicações
na Internet que sejam consideradas violadoras da propriedade
intelectual norte-americana. A indústria do copyright percebeu que os
principais buscadores, provedores de conteúdo e redes sociais online
estão sediadas nos EUA. Por isso, acreditam conseguir no ciberespaço
algo semelhante ao bem sucedido bloqueio econômico à Cuba.
Na prática, o que acontecerá se ela for aprovada?
Nenhuma
empresa sediada nos EUA poderá permitir o acesso a um número de IP (ou
seja, do protocolo de internet) ou a um domínio de um site acusado de
"roubar" imagem, vídeo, música, texto ou software de cidadãos ou
corporações norte-americanas, sob pena de ser considerado um verdadeiro
cúmplice. Mais do que aplicar a técnica chinesa do bloqueio aos
endereços dos sites, a lei exige que, em cinco dias, todas as
referências a estes sites sejam apagadas. Isto quer dizer que se meu
blog for acusado de violar o copyright de algum americano, o Google e o
Yahoo serão obrigados a deletar todas as referências a ele. Também a
Wikipedia deverá suprimir todos os links que teriam para o meu blog,
mesmo que os enlaces tratassem de outro tema.
Além
disso, são completamente impeditivos os custos para se recorrer na
Justiça norte-americana dessa ação de bloqueio administrativo. O pior é
que os dois projetos de lei visam controlar a criatividade e a inovação
também na área de aplicações na rede. Imagine se a Microsoft acusar o
Wordpress de violar determinadas patentes de software (que são aceitas
nos EUA). Como ficarão os blogs que usam a plataforma wordpress em todo o
planeta? Certamente terão seus IPs bloqueados em solo americano e os
mecanismos de busca deverão suprimir qualquer link que os indique.
Qual o impacto disso para a rede como um todo?
Se
o SOPA e o PIPA forem aprovados, será a primeira grande derrota da
cultura da liberdade diante da cultura da permissão e do vigilantismo.
Será um grande retrocesso para a criatividade e para a inovação da
comunicação em rede. A Internet poderá ser afetada nos seu sistema de
DNS (sistema de nomes de domínio) e isto poderá alterar profundamente a
sua dinâmica. Por isso, enquanto lutamos contra os traficantes do
copyright, temos que utilizar a estratégia das comunidades de software
livre. É preciso pensar e construir também novas tecnologias de rede que
possam anular a truculência do Estado norte-americano. Resistir,
mobilizar, denunciar, sem esquecermos que, talvez, o decisivo seja
hackear. E vale lembrar que hackear é hipertrofiar. Borrar as fronteiras
dos inimigos da liberdade. Elevar ao extremo seus absurdos. Não têm
nada a ver com crackear, roubar e invadir. Um exemplo é o plano para
lançar o primeiro satélite hacker (leia mais).
Quais são os interesses por trás da lei?
Esta
medida é defendida por membros do Partido Republicano e do Partido
Democratas que querem subordinar todos os direitos sociais e culturais
ao enrijecimento e extensão da propriedade intelectual. São lobistas de
associações como a MPAA (indústria cinematográfica), RIAA (indústria
fonográfica), BSA (Business Software Aliance) que articulam deputados e
senadores para apoiar tais medidas que são consideradas
anti-constitucionais por diversos analistas. Todavia, os deputados
defensores do SOPA e do PIPA defendem que tais medidas não se aplicam em
território americano, são para bloquear sites fora de sua jurisdição,
portanto, não fere a Constituição. Por trás dessas propostas está a
certeza de que não adianta atuar contra o usuário da Internet, pois esse
não acredita que compartilhar música, textos e vídeos seja uma
atividade criminosa. Por isso, querem atuar na própria infraestrutura de
conexão e de provimento de acesso da rede.
Há reação dos movimentos sociais?
Há
uma grande reação nos EUA contra o SOPA e o Protect IP Act. O principal
articulador da luta contra o bloqueio da Internet é a Electronic
Frontier Foundation. Ativistas do mundo inteiro se mobilizam contra
essas medidas. Organizações sem fins lucrativos, tais como a Wikipedia e
a Mozilla Foundation se mobilizam igualmente junto com corporações como
o Google e o Yahoo. No Brasil, os ativistas da liberdade na Internet
que lutam contra o AI-5 Digital se mobilizam desde o ano passado para
denunciar o SOPA. Diversos blogueiros também têm denunciado essas
investidas que visam censurar e bloquear a rede. Existe até um
aplicativo para celulares Android (veja) que permite o usuário
identificar as empresas que apóiam o SOPA, conforme tenho relatado no
Twitter (http://twitter.com/samadeu).
Sintonia Fina - Com Texto Livre
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