Luiz Carlos Azenha
No livro A Privataria Tucana,
Amaury Ribeiro Jr. faz menção às investigações feitas por ele sobre a
fortuna do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, a partir de documentos
públicos referentes ao cartola, obtidos na Junta Comercial e em
cartórios do Rio de Janeiro.
É curioso como quem tem experiência na
investigação de lavagem de dinheiro bate o olho na papelada e logo monta
o quebra-cabeças.
A empresa RLJ
Participações (R de Ricardo, L de Lúcia e J de João, presumimos) foi
montada em maio de 1992. É muito importante ficar de olho nas datas.
Notem como é curioso: quando a empresa foi formada aparecem como
testemunhas o advogado Alberto Ferreira da Costa (que não assina) e
Guilherme Terra Teixeira (irmão de Ricardo Teixeira):
Em
29 de julho de 1992, em Vaduz, Liechtenstein, quem é que recebe
procuração para assinar pela Sanud no Brasil? Sim, o Alberto Ferreira da
Costa, que aparece como testemunha no ato de formação da RLJ. Em tese, a
Sanud era uma empresa investidora no Brasil. Fica um claro ar de
arranjo:
Aqui
ficamos sabendo, também, que a Sanud surgiu em 7 de novembro de 1990 e
que quem assina por ela em Liechtenstein é o dr. Alex Wiederkehr,
advogado criador de empresas que funcionam em uma caixa postal e servem
de fachada para lavar dinheiro de origem suspeita ou desconhecida das
autoridades.
Em seguida, a Sanud se torna sócia da RLJ no Brasil, mais precisamente em 28 de setembro de 1992.
Fast
forward para 06/10/1994, na mais recente mudança societária registrada
na Junta Comercial do Rio de Janeiro: quem assina pela Sanud é o irmão
de Teixeira, aquele que lá atrás testemunhou o nascimento da RLJ
Participações.
Nada disso é novidade — ou pelo menos não deveria ser — para investigadores ou jornalistas brasileiros.
Uma
das CPIs que investigaram a CBF já tinha sentido o cheiro de
lavanderia: a Sanud fez empréstimos à RLJ, registrados pelo Conselho de
Controle das Atividades Financeiras (COAF), órgão ligado ao Ministério
da Fazenda. Mas a RLJ nunca pagou de volta!
A
novidade é que, quando a rede BBC denunciou Teixeira e João Havelange
como destinatários da propina da International Sports Marketing (ISL),
empresa que pagou para garantir contratos lucrativos com a FIFA, a
emissora britânica teve acesso à lista com valores e datas dos
pagamentos.
E quando foi o primeiro pagamento da ISL à Sanud, de 1 milhão de dólares?
10 de agosto de 1992.
Ou seja:
16 de maio de 1992, formada a RLJ;
29 de julho de 1992,
Sanud passa procuração para Alberto Ferreira da Costa em Vaduz, já
prevendo que a Sanud se tornaria sócia da RLJ Participações no Brasil;
10 de agosto de 1992, Sanud recebe a primeira propina listada pela ISL;
28 de setembro de 1992, Sanud se torna sócia da RLJ.
Também
tivemos acesso à lista e fica claro que, à medida em que a Sanud
recebia mais e mais dinheiro de propina lá fora, os investimentos da RLJ
cresciam e cresciam no Brasil
O
propinoduto da ISL foi documentado por um juiz-investigador da Suiça. A
papelada foi trancafiada numa corte de Zug. Advogados de Teixeira e
Havelange bloquearam a divulgação. Várias empresas jornalísticas querem
acesso à papelada e estão tentando isso por via judicial.
O
repórter Andrew Jennings, que fez a denúncia na BBC, acha que a FIFA
está sob pressão de quem interessa… dos grandes patrocinadores, que não
querem associar suas marcas a uma entidade agora conhecida por toda
sorte de falcatruas. Isso sem falar na pressão política de governos como
o da Inglaterra, que se julgou lesada ao perder o direito de sediar a
Copa.
A rede de proteção de
Havelange e Teixeira, lá fora, está se rompendo, como demonstra a
decisão de Havelange de se afastar do Comitê Olímpico Internacional
(COI) antes que fosse saído.
Mas,
voltando aos documentos exibidos acima — que, repito, já são de
conhecimento até do mundo mineral — o Amaury costuma ensinar que há
quatro indícios claríssimos de lavagem de dinheiro: empréstimos ou
investimentos vindos do Exterior, sem que a origem seja conhecida; o uso
de parentes nos negócios relacionados aos ” investimentos” (no caso de
Teixeira, o irmão, o filho e o sobrinho); empresas que recebem grandes
quantias mas dão prejuízo (caso da RLJ, que gastou um montão de dinheiro
sem dar retorno); sinais exteriores de riqueza.
O
surpreendente, mesmo, é que Teixeira e a CBF tenham sido alvo de duas
CPIs no Congresso — ambas resultaram em relatórios incriminadores — e
que a gente continue falando sobre o mesmo assunto mais de uma década
depois, sem maiores consequências.
Sintonia Fina via Com Texto Livre
"O jornalismo é, antes de tudo e sobretudo, a prática diária da inteligência e o exercício cotidiano do caráter"
(Cláudio Abramo)
(Cláudio Abramo)
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