O Sintonia Fina reproduz artigo do Blog da Cidadania.
Todos os dias, grandes jornais, televisões, rádios e portais de
internet travam uma disputa surda com blogueiros, tuiteiros e
facebookers pelos corações e mentes dos formadores de opinião, aquelas
pessoas de diversos estratos sociais, faixas etárias e regiões do país
que têm interesse em política e que, ao lado da percepção da sociedade
sobre a própria vida, influem na formação das duas grandes correntes
político-ideológicas do país, uma contra o governo e outra a favor, ou
uma conservadora e a outra progressista.
Antes de prosseguir, porém, qualifiquemos essas correntes quanto às ideias-força que as mobilizam.
Uma corrente político-ideológica acredita em nova forma de governar
em que sejam privilegiadas medidas do Estado socialmente inclusivas e as
relações sul-sul em detrimento das relações sul-norte. A outra corrente
privilegia a teoria de fazer o bolo crescer para só depois dividi-lo e
acredita em impor sacrifícios sociais até que o bolo tenha crescido
suficientemente – o que nunca se viu ocorrer, diga-se.
As duas grandes correntes políticas que dividem o país, portanto,
sempre foram a dos conservadores e a dos progressistas, sendo que tanto
de um lado quanto do outro cabem subgrupos com diferentes intensidades
de convicções naquelas macro premissas ou visões sobre o papel do Estado
e sobre quem, ao fim e ao cabo, irá ganhar ou perder na divisão de
riquezas e sacrifícios.
Essas correntes, hoje, digladiam-se diariamente, ainda que de forma desigual.
De um lado, grandes impérios de comunicação dotados de recursos
bilionários e que, através deles, conseguem eleger políticos que lhes
conferem um braço institucional votando ou administrando como esses
grupos empresariais querem. E esses grupos, valendo-se de ameaças de
ataques ou de promessas de afagos em seus veículos conseguiram instalar
seus representantes também no Poder Judiciário.
Do outro lado, um grande movimento na internet composto por
militantes de partidos, por cidadãos apartidários e por jornalistas sem
cobertura de empresas jornalísticas, todos decididos a combater os
conservadores apoiando políticos alinhados à sua visão, que, no caso, no
fim das contas são os políticos do PT, ainda que estes mantenham uma
relação muito mais distante com as novas mídias que os apoiam em maior
ou menor intensidade.
O que caracteriza esse lado progressista na internet é o trabalho
voluntário e isolado, caótico, sem um comando central como o dos grupos
de mídia conservadores, grupos que, por sua vez, obedecem a interesses
empresariais, de classe social e regionais que se comunicam entre si em
associações formais e informais, e que, junto aos políticos que elegem
com seus meios de comunicação, dão combate ao governo progressista.
Na verdade, essa é uma situação nova.
Até 2002, quando finalmente o
poder mudou de mãos no Brasil e a internet ainda era uma infante –
enquanto que hoje é uma adolescente –, não havia guerra de comunicação
alguma simplesmente porque a comunicação estava toda nas mãos de um dos
lados da eterna disputa entre conservadores e progressistas, uma disputa
que, ao longo do século passado, foi opondo grupos com divergências
cada vez menores, sendo que o lado progressista foi o que mais cedeu,
ainda que o lado conservador tenha passado a admitir certas e restritas
demandas sociais.
O surgimento da internet, portanto, permitiu que as eleições
deixassem de depender exclusivamente da percepção da sociedade sobre seu
bem-estar e do que a grande mídia dizia sobre os políticos, fórmula que
manteve certa corrente político-ideológica – mas não necessariamente
partidária – no poder pelo maior período do século XX, excluídos os
períodos de governos menos alinhados ao conservadorismo que acabaram
sendo derrubados à força, sem concurso das urnas.
Neste ponto entra a primeira eleição do pós regime militar em que o
poder mudou de mãos no Brasil. Parece pouco polêmico afirmar que Lula se
elegeu em 2002 por acidente, digamos assim. Se o país, à época, não
tivesse caído em um imenso buraco, o político trabalhista jamais teria
se convertido na única opção que faltava o eleitorado experimentar na
tentativa de sair de uma crise que parecia não ter saída.
Se a situação não tivesse piorado tanto, se tivesse melhorado um
pouco que fosse de forma a dar esperança à sociedade, com a mídia
demonizando a então oposição petista, dizendo-a adepta do “quanto pior,
melhor”, pintando-a como grupo “radical” que transformaria o Brasil em
uma “Cuba” o poder jamais teria mudado de mãos, pois governos
conservadores, dos quais o governo Fernando Henrique Cardoso foi o
último representante no poder, eram protegidos por aquela mídia de
qualquer ataque que lhes fizesse a oposição progressista, então
comandada por Lula e pelo PT.
Ao fim desse quilométrico preâmbulo, pois, surge a questão de fundo
que o post propõe: quem está vencendo a guerra da comunicação, neste
momento?
A resposta é menos simples do que parece. Apesar de os progressistas
terem chegado ao poder em 2002 e não saído mais, com três eleições
presidenciais que foram vencendo de forma cada vez mais contundente,
ampliando a base de apoio do governo a cada eleição, não se pode
desprezar o fato de que a máquina conservadora – composta pela mídia,
por partidos políticos e por amigos de ambos no Judiciário – tem
conseguido fazer quase um governo paralelo, vetando muita coisa que os
três últimos governos petistas (eleitos em 2002, 2006 e 2010) tentaram
fazer e não conseguiram exatamente porque os adversários não deixaram.
Os dois governos Lula e o governo Dilma, respectivamente, tiveram e
tem menos poder do que os dois governos Fernando Henrique Cardoso porque
o PT, enquanto na oposição, não tinha tamanho, mídia ou grandes amigos
no Judiciário como tem hoje e, assim, jamais conseguiu influir nos
governos do PSDB como este tem conseguido influir nos do PT a mando
daqueles setores empresariais, sociais e regionais que controlam a mídia
e os políticos que ela ainda elege com seu noticiário partidarizado,
ideologizado e editorializado.
A pergunta sobre quem está vencendo a disputa político-ideológica
lembra a metáfora sobre o copo meio cheio ou meio vazio, pois, apesar de
hoje os progressistas estarem em situação muito melhor do que jamais
estiveram, há que lembrar o preço que pagaram para chegar aonde
chegaram, porque não se pode negar quanto tiveram que abrir mão de
ideais e valores, fenômeno que os tornou mais parecidos com os
oponentes, ainda que não sejam iguais.
Para não deixar o leitor sem saber se comemora ou se desanima, vale
lembrar que é melhor que nenhuma corrente tenha poder esmagador sobre a
outra e que não exista um abismo intransponível entre as correntes
político-ideológicas, pois posições inconciliáveis costumam gerar
impasses e dos impasses podem surgir conflitos bem piores do que esses
que os conservadores e progressistas travam hoje na internet de forma
intensa, muitas vezes exagerada, quase sempre pouco educada, mas, sem
sombra de dúvida, pacífica e civilizada.
Sintonia Fina
Nenhum comentário:
Postar um comentário