7 de fev. de 2013

A ETERNA BUSCA DO GOLPE


Falando em dizer 


Paulo Moreira Leite


Derrotada em todas as opções para o comando do Congresso, a oposição retoma a pressão sobre os parlamentares brasileiros.


O clima é de fim de mundo.





Até jornalistas bem informados descrevem um universo apocalíptico, onde todos são corruptos, malandros, hipócritas – e quem não é apenas funciona como a exceção que confirma a regra.


Eu acho este raciocínio mais perigoso do que a própria corrupção que se procura denunciar, pois aponta para uma situação sem saída.


Quem descreve um mundo assim está dizendo que não há solução dentro das regras do jogo. Se todos são corruptos, não é dali que se deve esperar a salvação, certo?


Nós sabemos muito bem o que essa turma está falando sem dizer...


Não custa lembrar que nem Renan Calheiros nem Henrique Alves foram condenados em último recurso pela Justiça. Numa democracia, todos são inocentes até que se prove o contrário, correto?


Não temos tribunais de exceção. Nem admitimos linchamentos.


Os dois são acusados pelo Ministério Público, o que é muito diferente. Eu posso até achar que o ministério tem razão em suas denúncias, mas isso não encerra a discussão.


O Ministério Público tem obrigação de denunciar toda possibilidade de crime, que deve ser investigada e examinada, com isenção, pela Justiça. Até lá, no entanto, é preciso ter cautela.


Reportagem do Valor Econômico, ontem, lembrou que a principal acusação contra Henrique Alves, a de que possuía milhões de dólares no exterior, feita por sua ex-mulher, “posteriormente não se comprovou”.


E, se você se lembra do mensalão, irá lembrar-se que até um ex-ministro, Luiz Gushiken, passou sete anos na galeria dos acusados, aquela que os jornais publicavam diariamente, com retratinho de quem parecia procurado, até que acabou absolvido por falta de provas.


Quem gosta de berrar todo mundo é ladrão deveria saber que, naquela época, teve professor de colégio que se atreveu a dar sermão de cidadania para filhos de Gushiken em plena sala de aula – e não apareceu para se desculpar depois que tudo foi esclarecido.


O mesmo ocorreu com parlamentares como Paulo Rocha, o professor Luizinho...


Mesmo quem considera que Renan é culpado de tudo o que se diz a seu respeito, deveria recordar que seu comportamento não impediu que fosse ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso.


De duas uma: ou Renan era virgem até se tornar um aliado do governo Lula, ou estão ele só incomoda porque aliou-se a Lula.


O mesmo, vamos combinar, vale para Henrique Alves. É estatisticamente impossível que só depois de 40 anos de Congresso ele começasse a cometer atos considerados condenáveis... 


O debate que não quer terminar diz respeito a uma questão – o voto popular.


E isso é muito velho.


Procura-se sugerir que Renan e Henrique Alves foram eleitos porque têm esquemas, distribuem benefícios e favores escusos.


Ignora-se que eles praticam a regra do jogo que está aí. É o jogo do dinheiro, do aluguel de mandatos, da liberdade oferecida ao poder econômico para colonizar o Estado brasileiro.


Eu acho que isso sim ameaça a democracia. E, francamente, eu acho que já vivi o bastante para encontrar duas regras básicas para o funcionamento dos nossos regimes democráticos no Brasil.


Quando o dinheiro aluga o poder, todos ficam felizes. Quando isso não acontece mais, chamamos as baionetas do autoritarismo.


Foi assim 1964. Tentou-se fazer assim em 1956, em 1961...


No Brasil de hoje vivemos uma situação em que o dinheiro já não compra mais a felicidade de quem sempre mandou no País.


Os caras gastam, gastam, gastam, mas a turma que chegou ao Planalto a partir de 2002 pode até colocar no cofre, mas insiste em fazer o Bolsa Família, em aumentar a aposentadoria, em proteger o emprego...


Não há guerra ideológica, o PT de hoje está longe de ser o partido de raízes socialistas de seu nascimento, muitos petistas não se distinguem dos adversários que tanto denunciaram ao longo de 20 anos, mas mesmo esse pequeno desgaste, esse atrito, quase migalha, parece estar passando da conta...


O pessoal não suporta. E fica impaciente, nervoso. E é por isso que Renans incomodam, Henriques incomodam. São o alvo visível, fácil, de um ataque maior. 


Num conto policial de 1957, Luís Lopes Coelho, um dos pioneiros do gênero na literatura brasileira, já falava de “deputados negocistas” que fechavam negócios com “malandros.”


Era um dado assim, banal, do país daquele tempo, a democracia que sobreviveu a um suicídio presidencial e a duas aventuras militares do pessoal que não conseguia fazer a UDN chegar ao governo pelo voto...


Imagine que apenas sete anos depois desse conto ter sido publicado, em clima de grande indignação ocorreu o  golpe de 64, que iria acabar com a subversão e a corrupção – mas só serviu para provar com 100% de acerto que a indignação de natureza moral é um excelente combustível para medidas de caráter autoritário.


O país não precisa da indignação seletiva. Nem dos moralistas de marketing.


O necessário é respeitar a democracia e modificá-la por dentro, conforme suas regras e seu compasso.


E o ano de 2013 pode ser uma excelente oportunidade para fazer isso.


Mais do que nunca o País precisa debater uma reforma política que garanta que cada homem e cada mulher vale um voto – em vez de eleitores de 1 centavo e outros de 1 bilhão.


Num país com liberdade para os partidos políticos, com campanha na TV e uma imensa dívida social, apesar dos progressos recentes, é fácil saber quem tem a ganhar com esse regime – e quem teria a perder.


Quem se habilita? Pela resposta, já se sabe o compromisso de cada um.



Sintonia Fina
- via Esquerdopata 

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