Veja aqui o que o Partido da Imprensa Golpista (PIG) não mostra!
O Sintonia Fina reproduz texto de PHA no Conversa Afiada
|
O PiG (*) comemora o indiciamento dos “aloprados”: |
Justiça de Mato Grosso abre processo contra ‘aloprados’
E
omite que os “aloprados” nascem de emergência dentro das ambulâncias
super-faturadas do Cerra, quando era “o melhor Ministro da Saúde que
esta país já teve”, nas históricas palavras do Nelson Johnbim.
Este episódio se encontra muito bem descrito na carta de despedida da Globo do blogueiro sujo Rodrigo Vianna.
Numa singela homeagem a Ali Kamel, o Conversa Afiada reproduz o histórico desabafo:
# dez/06 - Lealdade
Quando cheguei à TV Globo, em
1995, eu tinha mais cabelo, mais esperança, e também mais ilusões. Perdi
boa parte do primeiro e das últimas. A esperança diminuiu, mas
sobrevive. Esperança de fazer jornalismo que sirva pra transformar –
ainda que de forma modesta e pontual. Infelizmente, está difícil
continuar cumprindo esse compromisso aqui na Globo. Por isso, estou indo
embora.
Quando entrei na TV Globo, os
amigos, os antigos colegas de Faculdade, diziam: “você não vai aguentar
nem um ano naquela TV que manipula eleições, fatos, cérebros”. Aguentei
doze anos. E vou dizer: costumava contar a meus amigos que na Globo
fazíamos – sim – bom jornalismo. Havia, ao menos, um esforço nessa
direção.
Na última década, em debates
nas universidades, ou nas mesas de bar, a cada vez que me perguntavam
sobre manipulação e controle político na Globo, eu costumava dizer:
“olha, isso é coisa do passado; esse tempo ficou pra trás”.
Isso não era só um discurso.
Acompanhei de perto a chegada de Evandro Carlos de Andrade ao comando da
TV, e a tentativa dele de profissionalizar nosso trabalho. Jornalismo
comunitário, cobertura política – da qual participei de 98 a 2006.
Matérias didáticas sobre o voto, sobre a democracia. Cobertura factual
das eleições, debates. Pode parecer bobagem, mas tive orgulho de
participar desse momento de virada no Jornalismo da Globo.
Parecia uma virada.
Infelizmente, a cobertura das eleições de 2006 mostrou que eu havia me
iludido. O que vivemos aqui entre setembro e outubro de 2006 não foi
ficção. Aconteceu.
Pode ser que algum chefe queira fazer abaixo-assinado para provar que não aconteceu. Mas, é ruim, hem!
Intervenção minuciosa em nossos
textos, trocas de palavras a mando de chefes, entrevistas de candidatos
(gravadas na rua) escolhidas a dedo, à distância, por um personagem
quase mítico que paira sobre a Redação: “o fulano (e vocês sabem de quem
estou falando) quer esse trecho; o fulano quer que mude essa palavra no
texto”.
Tudo isso aconteceu. E nem foi o pior.
Na reta final do primeiro
turno, os “aloprados do PT” aprontaram; e aloprados na chefia do
jornalismo global botaram por terra anos de esforço para construir um
novo tipo de trabalho aqui.
Ao lado de um grupo de colegas,
entrei na sala de nosso chefe em São Paulo, no dia 18 de setembro, para
reclamar da cobertura e pedir equilíbrio nas matérias: “por que não
vamos repercutir a matéria da “Istoé”, mostrando que a gênese dos
sanguessugas ocorreu sob os tucanos? Por que não vamos a Piracicaba,
contar quem é Abel Pereira?”
Por que isso, por que aquilo…
Nenhuma resposta convincente. E uma cobertura desastrosa. Será que
acharam que ninguém ia perceber?
Quando, no JN, chamavam Gedimar
e Valdebran de “petistas” e, ao mesmo tempo, falavam de Abel Pereira
como empresário ligado a um ex- ministro do “governo anterior”, acharam
que ninguém ia achar estranho?
Faltando seis dias para o
primeiro turno, o “petista” Humberto Costa foi indiciado pela PF. No
caso dos vampiros. O fato foi parar em manchete no JN, e isso era
normal. O anormal é que, no mesmo dia, esconderam o nome de Platão,
ex-assessor do ministério na época de Serra/Barjas Negri. Os chefes
sabiam da existência de Platão, pediram a produtores pra checar tudo
sobre ele, mas preferiram não dar. Que jornalismo é esse, que poupa e
defende Platão, mas detesta Freud! Deve haver uma explicação
psicanalítica para jornalismo tão seletivo!
Ah, sim, Freud. Elio Gaspari
chegou a pedir desculpas em nome dos jornalistas ao tal Freud Godoy. O
cara pode ter muitos pecados. Mas, o que fizemos na véspera da eleição
foi incrível: matéria mostrando as “suspeitas”, e apontando o dedo para a
sala onde ele trabalhava, bem próximo à sala do presidente.. . A
mensagem era clara. Mas, quando a PF concluiu que não havia nada contra
ele, o principal telejornal da Globo silenciou antes da eleição.
Não vi matérias mostrando as conexões de Platão com Serra, com os tucanos.
Também não vi (antes do
primeiro turno) reportagens mostrando quem era Abel Pereira, quem era
Barjas Negri, e quais eram as conexões deles com PSDB. Mas vi várias
matérias ressaltando os personagens petistas do escândalo. E, vejam:
ninguém na Redação queria poupar os petistas (eu cobri durante meses o
caso Santo André; eram matérias desfavoráveis a Lula e ao PT, nunca
achei que não devêssemos fazer; seria o fim da picada…).
O que pedíamos era isonomia.
Durante duas semanas, às vésperas do primeiro turno, a Globo de São
Paulo designou dois repórteres para acompanhar o caso dossiê: um em São
Paulo, outro em Cuiabá. Mas, nada de Piracicaba, nada de Barjas.!
Um colega nosso chegou a
produzir, de forma precária, por telefone (vejam, bem, por telefone! Uma
TV como a Globo fazer reportagem por telefone), reportagem com perfil
do Abel. Foi editada, gerada para o Rio. Nunca foi ao ar!
Os telespectadores da Globo
nunca viram Serra e os tucanos entregando ambulâncias cercados pelos
deputados sanguessugas. Era o que estava na tal fita do “dossiê”. Outras
TVs mostraram o vídeo, a internet mostrou. A Globo, não. Provava alguma
coisa contra Serra? Não. Ele não era obrigado a saber das falcatruas de
deputados do baixo clero. Mas, por que demos o gabinete de Freud
pertinho de Lula, e não demos Serra com sanguessugas?
E o caso gravíssimo das
perguntas para o Serra? Ouvi, de pelo menos 3 pessoas diretamente
envolvidas com o SP-TV Segunda Edição, que as perguntas para o Serra, na
entrevista ao vivo no jornal, às vésperas do primeiro turno, foram
rigorosamente selecionadas. Aquele diretor (aquele, vocês sabem quem)
teria mandado cortar todas as perguntas “desagradáveis” . A equipe do
jornal ficou atônita. Entrevistas com os outros candidatos tinham sido
duras, feitas com liberdade. Com o Serra, teria havido, deliberadamente,
a intenção de amaciar.
E isso era um segredo de polichinelo. Muita gente ouviu essa história pelos corredores.. .
E as fotos da grana dos
aloprados? Tínhamos que publicar? Claro. Mas, porque não demos a
história completa? Os colegas que estavam na PF naquele dia (15 de
setembro), tinham a gravação, mostrando as circunstâncias em que o
delegado vazara as fotos. Justiça seja feita: sei que eles (repórter e
produtor) queriam dar a matéria completa – as fotos, e as circunstâncias
do vazamento. Podiam até proteger a fonte, mas escancarando o que são
os bastidores de uma campanha no Brasil. Isso seria fazer jornalismo,
expor as entranhas do poder.
Mais uma vez, fomos seletivos: as fotos mostradas com estardalhaço. A fita do delegado, essa sumiu!
Aquele diretor, aquele que
controla cada palavra dos textos de política, disse que só tomou
conhecimento do conteúdo da fita no dia seguinte. Quer que a gente
acredite?
Por que nunca mostraram o conteúdo da fita do delegado no JN?
O JN levou um furo, foi isso?
Um colega nosso, aqui da Globo
ouviu a fita e botou no site pessoal dele… Mas, a Globo não pôs no ar… O
portal “G-1″ botou na íntegra a fita do delegado, dias depois de a
“CartaCapital” ter dado o caso. Era noticia? Para o portal das
Organizações Globo, era.
Por que o JN não deu no dia 29 de setembro? Levou um furo?
Não. Furada foi a cobertura da eleição. Infelizmente.
E, pra terminar, aquele
episódio lamentável do abaixo-assinado, depois das matérias da
“CartaCapital” . Respeito os colegas que assinaram. Alguns assinaram por
medo, outros por convicção. Mas, o fato é que foi um abaixo-assinado em
defesa da Globo, apresentado por chefes!
Pensem bem. Imaginem a seguinte
hipótese: a revista “Quatro Rodas” dá matéria falando mal da suspensão
de um carro da Volkswagen, acusando a empresa de deliberadamente não
tomar conhecimento dos problemas. Aí, como resposta, os diretores da
Volks têm a brilhante idéia de pedir aos metalúrgicos pra assinar um
manifesto em defesa da empresa! O que vocês acham? Os metalúrgicos
mandariam a direção da fábrica catar coquinho em Berlim!
Aqui, na Globo, muitos
preferiram assinar. Por isso, talvez, tenhamos um metalúrgico na
Presidência da República, enquanto os jornalistas ficaram falando
sozinhos nessa eleição…
De resto, está difícil
continuar fazendo jornalismo numa emissora que obriga repórteres a
chamarem negros de “pretos e pardos”. Vocês já viram isso no ar? Sinto
vergonha…
A justificativa: IBGE (e,
portanto, o Estado brasileiro) usa essa nomenclatura. Problema do IBGE.
Eu me recuso a entrar nessa. Delegados de policia (representantes do
Estado) costumavam (até bem pouco tempo) tratar companheiras (mesmo em
relações estáveis) como “concubinas” ou “amásias”. Nunca usamos esses
termos!
Árabes que chegaram ao Brasil
no início do século passado eram chamados de “turcos” pelas autoridades
(o passaporte era do Império Turco Otomano, por isso a nomenclatura) .
Por causa disso, jornalistas deviam chamar libaneses de turcos?
Daqui a pouco, a Globo vai pedir
para que chamemos a Parada Gay de “Parada dos Pederastas”. Francamente,
não tenho mais estômago.
Mas, também, o que esperar de
uma Redação que é dirigida por alguém que defende a cobertura feita pela
Globo na época das Diretas?
Respeito a imensa maioria dos
colegas que ficam aqui. Tenho certeza que vão continuar se esforçando
pra fazer bom Jornalismo. Não será fácil a tarefa de vocês.
Olhem no ar. Ouçam os
comentaristas. As poucas vozes dissonantes sumiram. Franklin Martins foi
afastado. Do Bom dia Brasil ao JG, temos um desfile de gente que está
do mesmo lado.
Mas sabem o que me deixou preocupado mesmo? O texto do João Roberto Marinho depois das eleições.
Ele comemorou a reação (dando a
entender que foi absolutamente espontânea; será que disseram isso pra
ele? Será que não contaram a ele do mal-estar na Redação de São Paulo?)
de jornalistas em defesa da cobertura da Globo:
“(…)diante de calúnias e
infâmias, reagem, não com dúvidas ou incertezas, mas com repúdio e
indignação. Chamo isso de lealdade e confiança”.
Entendi. Ele comemora que não
haja dúvidas e incertezas.. . Faz sentido. Incerteza atrapalha
fechamento de jornal. Incerteza e dúvida são palavras terríveis. Devem
ser banidas. Como qualquer um que diga que há racismo – sim – no Brasil.
E vejam o vocabulário:
“lealdade e confiança”. Organizações ainda hoje bem populares na Itália
costumam usar esse jargão da “lealdade”.
Caro João, você talvez nem saiba direito quem eu sou.
Mas, gostaria de dizer a você
que lealdade devemos ter com princípios, e com a sociedade. A Globo,
infelizmente, não foi “leal” com o público. Nem com os jornalistas. Vai
pagar o preço por isso. É saudável que pague. Em nome da democracia!
João, da família Marinho, disse mais no brilhante comunicado interno:
“Pude ter certeza absoluta de
que os colaboradores da Rede Globo sabem que podem e devem discordar das
decisões editoriais no trabalho cotidiano que levam à feitura de nossos
telejornais, porque o bom jornalismo é sempre resultado de muitas
cabeças pensando”.
Caro João, em que planeta você
vive? Várias cabeças? Nunca, nem na ditadura (dizem-me os companheiros
mais antigos) tivemos na Globo um jornalismo tão centralizado, a tal
ponto que os repórteres trabalham mais como bonecos de ventríloquos,
especialmente na cobertura política!
Cumpro agora um dever de
lealdade: informo-lhe que, passadas as eleições, quem discordou da linha
editorial da casa foi posto na “geladeira”. Foi lamentável, caro João.
Você devia saber como anda o ânimo da Redação – especialmente em São
Paulo.
Boa parte dos seus
“colaboradores” (você, João, aprendeu direitinho o vocabulário
ideológico dos consultores e tecnocratas – “colaboradores” , essa é boa…
Eu não sou colaborador, coisa nenhuma! Sou jornalista!) está triste e
ressabiada com o que se passou.
Mas, isso tudo tem pouca importância.
Grave mesmo é a tela da Globo –
no Jornalismo, especialmente – não refletir a diversidade social e
política brasileira. Nos anos 90, houve um ensaio, um movimento em
direção à pluralidade. Já abortado. Será que a opção é consciente?
Isso me lembra a Igreja
Católica, que sob Ratzinger preferiu expurgar o braço progressista. Fez
uma opção deliberada: preferiram ficar menores, porém mais coesos
ideologicamente. Foi essa a opção de Ratzinger. Será essa a opção dos
Marinho?
Depois, não sabem porque os protestantes crescem…
Eu, que não sou católico nem protestante, fico apenas preocupado por ver uma concessão pública ser usada dessa maneira!
Mas, essa é também uma carta de despedida, sentimental.
Por isso, peço licença pra falar de lembranças pessoais.
Foram quase doze anos de Globo.
Quando entrei na TV, em 95, lá
na antiga sede da praça Marechal, havia a Toninha – nossa mendiga de
estimação, debaixo do viaduto. Os berros que ela dava em frente à
entrada da TV traziam uma dimensão humana ao ambiente, lembravam-nos da
fragilidade de todos nós, de como nossa razão pode ser frágil.
Havia o João Paulada – o faz-tudo da Redação.
Havia a moça do cafezinho (feito no coador, e entregue em garrafas térmicas), a tia dos doces…
Era um ambiente mais caseiro, menos pomposo. Hoje, na hora de dizer tchau, sinto saudade de tudo aquilo.
Havia bares sujos, pessoas simples circulando em volta de todos nós – nas ruas, no Metrô, na padaria.
Todos, do apresentador ao
contínuo, tinham que entrar a pé na Redação. Estacionamentos eram
externos (não havia “vallet park”, nem catraca eletrônica). A caminhada
pelas calçadas do centro da cidade obrigava-nos a um salutar contato com
a desigualdade brasileira.
Hoje, quando olho pra nossa
Redação aqui na Berrini, tenho a impressão que estou numa agência de
publicidade. Ambiente asséptico, higienizado. Confortável, é verdade.
Mas triste, quase desumano.
Mas, há as pessoas. Essas valem a pena.
Pra quem conseguiu chegar até o fim dessa longa carta, preciso dizer duas coisas…
1) Sinto-me aliviado por ficar
longe de determinados personagens, pretensiosos e arrogantes, que exigem
“lealdade”; parecem “poderosos chefões” falando com seus seguidores.. .
Se depender de mim, como aconteceu na eleição, vão ficar falando
sozinhos.
2) Mas, de meus colegas, da imensa maioria, vou sentir saudades.
Saudades das equipes na rua –
UPJs que foram professores; cinegrafistas que foram companheiros; esses
sim (todos) leais ao Jornalismo.
Saudades dos editores – que tiveram paciência com esse repórter aflito e procuraram ser leais às minúcias factuais.
Saudades dos produtores e dos chefes de reportagem – acho que fui leal com as pautas de vocês e (bem menos) com os horários!
Saudades de cada companheiro do apoio e da técnica – sempre leais.
Saudades especialmente, das
grandes matérias no Globo Repórter – com aquela equipe de mestres (no
Rio e em São Paulo) que aos poucos vai se desmontando, sem lealdade nem
respeito com quem fez história (mas há bravos resistentes ainda).
Bem, pelo tom um tanto ácido dessa carta pode não parecer. Mas levo muita coisa boa daqui.
Perdi cabelos e ilusões. Mas, não a esperança.
Um beijo a todos.
Rodrigo Vianna.
Sintonia Fina
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