Marcello Napolitano, dica de Patricia Tavares
As redes sociais podem nos ajudar a superar a pífia atuação de mídia investigativa
que existe no país. O problema, como tão bem comentou Maíra Meyer, é que as pessoas
deveriam estar dispostas a ler mais, se informar mais, antes de partir para condenação
ou linchamento público. Daí sim, teremos as redes sociais ajudando a sociedade civil
a promover mudanças significativas. Mas sem conteúdo, não há progresso – apenas
manipulação.
O conhecimento é libertador
Há alguns dias, venho acompanhando diversos amigos do Facebook compartilhando
um link “A Gota D’água +10”.
Eu não assistia, pois todos takes que apareciam na tela eram de pessoas que não
têm a mínima credibilidade comigo.
No entanto, eu prezo muito pelo protesto. Acredito que todos (sem exceção),
sejam artistas da Globo ou estudantes da USP, têm o direito de protestar contra
ou a favor do que quiserem. Estejam certos ou errados, a democracia brasileira –
graças aos estudantes da década de 1960, que protestaram, apanharam e morreram por
isso – nos permite protestar. Esses protestos geram comentários e opiniões contra
e a favor. E isso também é legítimo e saudável. O grande problema é quando os comentários
são sem embasamento algum. Ou seja, apenas dedos nervosos no botão “compartilhar” do Facebook, gritando bravatas contra quem quer que seja. Apenas uma ressalva: os
dedos nervosos com bravatas do FB também são legítimos, mas dá uma vergonha alheia
(lembremos o caso do Lula no SUS).
Portanto, julgamentos à parte, hoje [17/11], eu acordei e resolvi assistir ao vídeo. Vi muitos artistas revoltados,
entoando palavras de ordem contra a construção da usina. Por um lado eu achei muito
legal o protesto, pois notei que há vida cerebral em alguns deles. Por outro lado,
achei essa vida cerebral um pouco vazia. Vazia, por que os argumentos são sempre
os mesmos: impostos, vai sair de nosso bolso, nos livros de história vai estar escrito
etc.
Essa cultura que está se formando é engraçada: “Sou um mártir, pois eu
‘tô’ pagando meus impostos.” Pagar os impostos em dia não é orgulho para ninguém.
É apenas uma obrigação de todo cidadão.
Outra curiosidade são os artistas da Rede Globo falarem em a presidente
escrever a história do Brasil. Está na história o apoio da emissora à ditadura militar,
que puxou o Brasil para trás e matou milhares de jovens durante 21 anos. Também
está escrito na história a maneira com que essa mesma emissora editou seu principal
telejornal e ajudou a eleger um dos maiores corruptos do Brasil. Todos os bons profissionais
escolhem onde querem trabalhar. Eu, por exemplo, sempre fiz isso. Por que eles não
fazem?
Depois de assistir, fiquei com vontade de compartilhar, pois os argumentos
são fortes e a maneira com que são entoados – são artistas bem treinados – faz nossa
cabeça. Porém, o apelo fervoroso pela assinatura, assim como a construção tão profissional
do vídeo e a maneira como eles falavam, tão bem decorado, me incomodaram bastante.
Então, como estou curtindo minhas férias, resolvi pesquisar os fatos e escrever
sobre isso.
Estudando bem pouco, ou seja, indo até o google, digitando “usina de belo
monte”, qualquer pessoa se depara com as primeiras informações incorretas do vídeo.
– O custo da Usina não é de R$30 bilhões, mas R$19 bilhões.
– Tenho duas fontes sobre a área alagada: 400km2 e 516km2.
Nenhuma fonte aponta os 640 do vídeo.
– O site da usina esclarece que a usina não afeta o Parque Nacional do Xingu
e que a qualidade de vida da população que será removida e indenizada irá melhorar,
pois hoje, em época de cheias, eles vivem em casas alagadas e em época de secas,
vivem em casas cheias de lama.
– O mito da energia eólica substituindo completamente as novas usinas hidrelétricas
não mostra as limitações de custo, de instalação, os problemas ambientais embutidos
nelas. Não se analisa a matriz energética, para avaliar a viabilidade ou não de
se abrir mão das usinas amazônicas. (Luiz Nassif)
– A menor eficiência da usina dá-se pela utilização de um modelo que afeta
menos o ambiente, aquele que gera energia em cima da correnteza do rio. Para ter
maior eficiência, seria necessário um grande lago, que inundaria áreas enormes.
O vídeo de nossos queridos artistas, ídolos de alguns, portanto, contém
diversas inconsistências. Minha dúvida é a quem esse protesto interessa? Quem está
patrocinando esses artistas?
Não vou compartilhar e convido a vocês a se informarem antes de compartilhar.
Uma informação: a usina não é um projeto do PT nem do PSDB. Ele se iniciou
na década de 1970, foi amplamente apoiado nos oito anos do governo FHC, que em 2002
criticou os ambientalistas e disse que a oposição à construção de usinas hidrelétricas
atrapalhava o desenvolvimento do País. A decisão foi deixada para os governos Lula,
quando foi feita uma revisão do projeto, o que não significa que melhorou ou tornou
menos nocivo ao ambiente. Tomem cuidado com as bravatas.
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