Filho de peixe peixinho é
O Sintonia Fina reproduz texto do Tijolaço
Marcos Coimbra: o Millenium e o voto distrital
Do sociólogo e direto do Vox Populi, Marcos Coimbra, hoje, no Correio Braziliense:
“A
recente campanha em favor do voto distrital tem uma história curiosa.
Primeiro, foi divulgada com o estardalhaço que a mídia de direita dedica
aos temas que considera prioritários, ocupando a capa de revistas e as
colunas de seus comentaristas mais prestigiados. Depois, teve seu
lançamento “sério” e “oficial”.
Aconteceu esta semana, em São
Paulo, no Instituto Millenium, seu 7º Colóquio, com uma interrogação no
título Voto Distrital ou Proporcional? Os participantes responderam em
coro (quase unânime): distrital.
Várias coisas foram
interessantes no evento. Uma, é que, praticamente tudo que havia sido
publicado pela imprensa em defesa do voto distrital estava lá: os mesmos
especialistas ouvidos eram os palestrantes, os números e cálculos
divulgados tinham sido preparados para ele. Parece que a mídia
conservadora teve acesso privilegiado e pode antecipar o que seria
tratado no Colóquio.
Outra é que, nele, tudo estava mais claro do
que na imprensa. Enquanto ela apresentou sua argumentação como se
resultasse de reportagens e trabalhos “técnicos”, no colóquio a posição
política da maioria dos convidados estava escancarada: o presidente do
movimento Endireita Brasil foi o mediador dos debates, por exemplo. O
evento foi realizado na sede da Federação do Comércio de São Paulo.
O
Instituto Millenium congrega empresários, banqueiros, alguns
intelectuais e muita gente da grande imprensa: os proprietários dos
maiores veículos de comunicação, seus chefes de redação, alguns
jornalistas e comentaristas, quase todos os personagens que costumam
ouvir quando precisam da opinião de “entendidos” (em qualquer coisa,
desde a crise da Líbia à musica popular). Não esquecendo diversos
ex-integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso.
Na sua
apresentação, o instituto diz que é “referência na divulgação dos temas
democracia, liberdade, estado de direito e economia de mercado”. Seu
objetivo explícito é “atingir a opinião pública, conscientizando-a sobre
os valores que considera primordiais para o fortalecimento da
democracia e para o desenvolvimento do país”.
Trata-se de um
think tank da direita brasileira, uma organização destinada a preparar e
propagandear sua agenda para o país. A grande diferença que tem em
relação a instituições semelhantes em outros países (como os Estados
Unidos, onde existem diversas), é a super representação, em seus
quadros, de dirigentes dos grandes grupos da indústria da comunicação.
Enquanto suas congêneres no exterior precisam dar tratos à bola para
levar suas ideias à mídia, aqui as coisas podem ser resolvidas
amigavelmente, com todo mundo sentado em torno da mesma mesa.
Não
é, no entanto, a primeira vez que, no Brasil, uma entidade como o
Instituto Millenium existe e tem essa ligação orgânica com a grande
imprensa. No início dos anos 1960, houve algo parecido: o Ipes
(Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), de atuação nada irrelevante
na criação das condições sociais e políticas que levaram ao golpe de
1964. (Chega a ser engraçado: os pais de alguns membros e mantenedores
do Millenium fizeram parte do Ipes, confirmando a tese de que “filho de
peixe, peixinho é”.) Mas isso não quer dizer que o Millenium, nem seus
integrantes (certamente não todos), sejam golpistas.
É evidente
que as pessoas de direita têm todo o direito de se reunir para discutir
suas ideias. De procurar fazer com que elas sejam conhecidas pela
sociedade. De usar suas empresas e seu dinheiro para isso.
É
natural, na democracia, que apóiem os candidatos com que mais se
identificam. Que façam oposição àqueles de que discordam: os
esquerdistas, socialistas, progressistas. E que não gostem dos petistas e
“lulopetistas” (palavra inventada pelos jornais dos empresários que
integram o Instituto).
Seria bom para todos, no entanto, que
houvesse mais transparência nas relações entre a direita e alguns grupos
de mídia. Que elas fossem assumidas com franqueza.
Pode-se
concordar ou não com a campanha pró-voto distrital. Mas é ruim quando a
opinião pública não fica sabendo de onde vem, quem a inspira e organiza.
O risco é que ela compre gato por lebre”.
Clique aqui para ler: Veja, Merval e Cerra querem o distrital. Falta o perito Molina
Clique aqui para ir ao site do Instituto Millenium para ver, rosto-a-rosto quem está dentro do tanque.
Sintonia Fina
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