Saiu na Folha:
Censura na imprensa via Justiça é alvo de críticas
DE BRASÍLIA
Censura judicial imposta a veículos de comunicação e direito de acesso a documentos públicos foram os principais temas debatidos na 6ª Conferência Legislativa sobre Liberdade de Expressão.
O evento, organizado pelo Instituto Palavra Aberta, ocorreu na manhã desta terça-feira, no auditório da TV Câmara, e contou com a participação de deputados, uma integrante do governo federal, acadêmicos e representantes de veículos de comunicação.
O primeiro painel, ‘Avanços e desafios da liberdade de expressão’, foi apresentado pelo jornalista e professor da USP/ESPM Eugênio Bucci. Na palestra, Bucci ponderou que a liberdade de imprensa teve avanços nos últimos anos, mas que não deixou de estar na ordem do dia.
Um exemplo recente citado pelo jornalista e por outros participantes do evento foi a proibição judicial, em 2009, de que o jornal “O Estado de S. Paulo” veiculasse reportagens sobre operação da Polícia Federal que investigava o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
“E não é apenas um, mas foram dezenas os veículos jornalísticos que sofreram consequências dessa nova modalidade de censura. E essas ações, que resultam em censura judicial, quase que sempre decorrem da demanda de políticos ou de parentes de políticos. São os de cima que, contrariados, demandam a censura, e muitas vezes, vociferam contra a imprensa, arrancam microfones das mãos de jornalistas, amaldiçoam a imprensa”, afirmou Bucci.
Um dos debatedores do painel foi o jornalista da Folha Fernando Rodrigues, para quem faltam a cultura e o valor da liberdade de expressão no país. “É muito difícil para todos nós imaginarmos que, algum dia, haverá na sociedade brasileira, num curto período, manifestações de massa a favor da liberdade de expressão. (…) Esse valor não existe”, afirmou Rodrigues.
Ao comentar os debates ocorridos após a censura imposta ao “O Estado de S. Paulo”, o diretor de conteúdo do jornal, Ricardo Gandour, criticou qualquer medida de restrição à liberdade de expressão. “[Algumas] manifestações vão no sentido de que um pouquinho de censura talvez proteja certos setores da sociedade. Esse raciocínio é perigosíssimo. Se um pouquinho de censura pode vir a ser benéfico, a primeira pergunta que surge é: quem determina a dose? E qual é o limite desse pouco? E por que não um pouquinho de mentira? De tortura?”
A censura judicial chega a ser pior que a censura imposta pela ditadura militar, defendeu Taís Gasparian, mestre em direito pela USP e advogada da Folha. (ênfase minha – PHA) “A censura judicial sequer sabe o que será publicado.” Muitos desses casos, diz a advogada, têm sido revertidos.
Gasparian integrou o segundo painel, intitulado “Desafios da liberdade de expressão na era da internet”. O assunto foi apresentado pelo jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira, que fez um paralelo com décadas passadas. “O trote era exatamente o que se faz hoje na internet. A gente jamais admitiu a possibilidade de entrar com censura sobre o telefone.”
FILMES POLÊMICOS
Outros exemplos citados no debate foram os filmes “Je vous Salue, Marie”, de Jean-Luc Godard, e o contemporâneo “A Serbian Film – Terror sem limites”, que inclui cenas de pedofilia e necrofilia. Os dois foram alvo de restrição de divulgação. O primeiro, vetado durante o governo Sarney, e o segundo, alvo de proibição, este mês, pela Justiça Federal em Belo Horizonte.
“A ideia de que o Poder público pode conceder ou negar permissão para que alguém manifeste sua arte ou seu pensamento é até hoje aceita entre nós, ainda que com mal entendidos, ainda que zonas de sombra persistam, ela ainda é aceita”, criticou Bucci.
SIGILOS
Também foram tema do debate a imposição de duas formas de sigilo: 1) O sigilo de Justiça, que muitas vezes tentaria se transferir ao trabalho jornalístico; 2) e o sigilo de documentos públicos. Ambas foram rejeitadas.
Bucci abordou o primeiro. “A imprensa só é essencial à sociedade justamente porque, não sendo governada pelos poderes do Estado, pode se empenhar com independência em descobrir os segredos que interessam ao cidadão. Logo, não há sentido querer impor à imprensa alguma forma de controle para que ela seja obrigada a preservar sigilos que não são dela”, disse.
A necessidade de se garantir, em lei, o direito de acesso às informações públicas foi defendida por Rodrigues. “Quando um governante decide, por vontade própria, fornecer algumas informações, isso é muito bom. Mas o próximo que for eleito pode decidir que isso não seja mais necessário. É muito importante que exista uma lei aprovada que garanta isso de maneira perene a todos os brasileiros.”
Para Gabeira, até site que prega ódio deve ser livre
João Domingos – O Estado de S.Paulo
O ex-deputado e jornalista Fernando Gabeira afirmou que os blogs ligados a grandes jornais e publicações têm mais credibilidade, porque se preocupam em apurar a informação e ouvir o outro lado. “Um terço dos gastos das empresas vem da apuração. São elas que se preocupam em pôr alguém do lado de dentro do muro da fortaleza do Muamar Kadafi”, disse o jornalista, durante a 6.ª Conferência sobre Liberdade de Imprensa, na Câmara.
Gabeira defendeu ainda a manutenção de todos os sites existentes, até dos que pregam a disseminação do ódio e das ofensas porque, segundo ele, não cabe ao Estado interferir na liberdade de expressão, mesmo que o conteúdo possa ser motivo de questionamentos. As maiores vítimas desses espaços de ódio na internet são os judeus, migrantes e homossexuais, disse Gabeira. Ele citou estudo da Fundação Simon Wiesenthal, que identificou 31 mil sites de ódio no mundo.
Quanto à censura, Gabeira contou que durante o governo de José Sarney (1985-1990) o então ministro da Justiça, Fernando Lyra, o informou de que teria de censurar o filme Je Vous Salue Marie, do francês Jean Luc Godard. “O Fernando Lyra me disse que Sarney determinou a censura ao filme por ordem da mãe, dona Kiola.” De acordo com Gabeira, Lyra relatou a conversa de Sarney: “Se não censurarmos o filme, minha mãe disse que não me deixa mais entrar em casa.”
A assessoria de Sarney informou que a censura ocorreu por outro motivo. Segundo a assessoria, pressionado pela Igreja e com a justificativa de ser católico, Sarney viu-se sem alternativa. O filme retrata a vida de Nossa Senhora nos tempos atuais. Ela é uma frentista de posto de gasolina.
Em tempo 2:
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Sintonia Fina - Conversa Afiada
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