Ex-presos políticos, militantes de direitos humanos e do movimento estudantil fazem protesto durante audiência de acusação do coronel Ustra.
Joana Tavares, texto; e fotos Angu Arte, Poesia & Kontrakultura/CMI
Cerca de 250 pessoas, entre ex-presos políticos, militantes de direitos humanos e do movimento estudantil, se reuniram na tarde de quarta-feira, dia 27, diante do Fórum João Mendes do Tribunal de Justiça de São Paulo, para lembrar a história dos que lutaram contra ditadura e pedir justiça aos crimes cometidos pelos representantes do Estado.
Dentro do Fórum, na 20ª Vara Cível, seis testemunhas de acusação confirmaram a participação do coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra – comandante do Destacamento de Operações de Informações (DOI) do Centro de Operações de Defesa Interna (CODI) de 1970 a 1974 – no assassinato de Luiz Eduardo Merlino, torturado até a morte em 1971. As testemunhas de defesa do coronel, que não compareceu à audiência, serão ouvidas por carta precatória, instrumento utilizado pela Justiça quando existem indivíduos em comarcas diferentes.
A ação foi movida pela irmã de Merlino, Regina Maria Merlino Dias de Almeida, e por sua ex-companheira, Ângela Mendes de Almeida. “Não é uma ação por indenização, é por danos morais”, explica Tatiana Merlino, sobrinha de Luiz Eduardo. “Tanto a família não está interessada no dinheiro do coronel Ustra, que a quantia será estipulada pela juíza. Se a família ganhar a ação, vai doar o dinheiro para uma entidade de direitos humanos”, afirma.
Para Tatiana, “essa ação não é só do Merlino. Ela é representativa de todas as vítimas da ditadura militar, os que foram assassinados e os que sobreviveram também. Tem uma importância enorme para acabar com a impunidade dos crimes cometidos pelo Estado”, aponta.
As seis testemunhas de acusação – Otacílio Cecchini, Eleonora Menicucci de Oliveira e Leane de Almeida, ex-militantes do Partido Operário Comunista (POC) e da Ação Libertadora Nacional (ALN), além do ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo de Tarso Vannuchi, do historiador e escritor Joel Rufino dos Santos e Laurindo Junqueira Filho – confirmaram a participação do coronel nas torturas que levaram à morte do jornalista, então com 23 anos.
Apesar de pública, a sala reservada para a audiência não suportava ninguém além das partes diretamente envolvidas no processo. Lúcio França, advogado do Tortura Nunca Mais, acompanhou a audiência como observador e afirmou que as testemunhas relataram as bárbaras torturas a que Merlino foi submetido com a anuência do coronel Ustra.
Cartas precatórias
Em relação às testemunhas de defesa, ele relatou que foram expedidas precatórias para Pipas (RS), Brasília (DF), Curitiba (PR), Águas Claras e Boa Vista (RR). A carta de Brasília seria do senador José Sarney, que já teria dado indícios de que não testemunharia.
O depoimento de Sarney se justificaria pelo fato de ele ter sido um dos parlamentares que ajudou a aprovar a Lei de Anistia, em 1979. O advogado de Ustra, Paulo Esteves, disse à Agência Estado que o senador poderia explicar que “a lei beneficiou os dois lados”. Para a mesma agência, a assessoria de José Sarney informou que o presidente do Senado não pretende atender às solicitações da defesa. Segundo os assessores, ele foi apenas “um dos parlamentares de diferentes tendências políticas a votar a lei”.
À Agência Brasil, Paulo Esteves disse que seu cliente reafirma que “jamais participou de qualquer ato de agressão ou de violência contra qualquer pessoa, tanto em sua vida civil como profissional” e que “nunca determinou nada contra ninguém”.
No entanto, os seis depoimentos confirmaram a participação do coronel nos atos de tortura e desmentem a versão de que Luiz Eduardo teria morrido após se jogar embaixo de um caminhão na BR116, no município de Jacupiranga (SP). Os testemunhos lembraram que ele ficou severamente machucado depois das sessões de tortura. Uma das testemunhas contou ter sido torturada ao lado de Merlino.
Do lado de fora, Adriano Diogo, deputado estadual pelo PT e ex-preso político, relatou ao microfone diversos casos que apontam a participação do coronel Ustra nas torturas dos presos. Lembrou de uma ocasião em que estudantes da USP, junto com Dom Paulo Evaristo Arns, realizaram um ato ecumênico com 10 mil pessoas nas ruas. Como represália, o então major Ustra tirou todos os presos das celas e promoveu uma sessão de espancamento. “Sem fazer uma pergunta de interrogatório. Pau puro. Ele mesmo estava com uma enorme palmatória na mão. Ele distribuiu porrada para homens e mulheres. Torturou a todos no pátio, junto com outros criminosos que ainda estão na ativa”, lembrou.
“Ele coordenava e comandava todas as sessões de tortura no Doi-Codi. Ele e o senhor Boilesen, que era diretor da Ultragas. O Ustra nunca fez segredo dessa visão que ele tinha. É dessa pessoa que estamos falando: Carlos Alberto Brilhante Ustra, assassino do povo brasileiro”, contou Diogo.
Sintonia Fina - via Limpinho
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